sexta-feira, 9 de novembro de 2007

CPMF permite um controle maior no que se refere à incidência do Imposto de Renda sobre as operações de capital (Pedro do Couto)



Pedro do Couto, em sua coluna, na Tribuna da Imprensa:

CPMF pouco tem a ver com salário

O ministro Guido Mantega propôs à oposição um acordo em torno da CPMF que inclui uma redução no Imposto de Renda para os assalariados que ganham até 4 mil e 300 reais por mês. Poderiam deduzir 214 reais na declaração do IR de 2008 que apresentariam em 2009. E, para os que ganham até 1.716 reais, estes teriam direito a pagar menos 0,38 por cento do que descontam hoje para o INSS. Nenhuma das duas alternativas faz sentido.

A CPMF é um imposto que incide sobre o capital, movimentação financeira, não especificamente em cima do salário. A idéia está desfocada. Criaria um esquema burocrático complicado sem efeito prático algum. Veja-se o seguinte: se com uma alíquota de 0,38 por cento sobre a circulação de cheques a CPMF produz, este ano, 36 bilhões de reais é porque a movimentação financeira anual, agora, em 2007, alcança algo em torno de 1 trilhão e 200 bilhões.

É só projetar o percentual à base de 1 por cento e, em seguida, dividir por 3,3. Os vencimentos do trabalho entram na movimentação financeira, mas com um peso muito menor do que o capital. Tanto é assim que, do Produto Interno Bruto de quase 2 trilhões, os salários pesam 600 bilhões de reais.

A solução não é por aí. Permitir um desconto anual teórico de 214 reais não representa nada. Jogo para arquibancada e nada mais. Desonerar 0,38 por cento na contribuição para o INSS, isso é um desastre. Criaria um desequilíbrio muito grande. Prejudicaria as aposentadorias e pensões sem resolver nada. Como o orçamento da Previdência Social, neste exercício, é de 189 bilhões, o percentual a ser abatido corresponderia aproximadamente a 600 milhões de reais. Mas a questão não acaba aí.

A receita do INSS é proporcionada pela contribuição dos empregadores e empregados. Os empregadores entram com 22 por cento sobre a folha de salários, sem limite. Os empregados descontam, em média, 10 por cento, mas até o teto correspondente a dez salários mínimos. O que dá o máximo mensal de 380 reais. Os empresários, de fato, são os que sustentam o sistema previdenciário, como se vê. Não há limite para o seu desconto. Têm o direito, aliás como os empregados, de deduzir o montante recolhido do Imposto de Renda. Mas esta é outra coisa.

Pela proposta do titular da Fazenda os empregadores poderiam reduzir também o que pagam ao INSS? Não está clara a colocação do tema, como se vê. Mas, mesmo que estivesse, não adiantaria nada. Guido Mantega está misturando encargos do capital com os que têm que ser suportados pelo trabalho. Nada a ver. Além do mais, o que são 214 reais por ano de dedução? Praticamente nada. A CPMF dificilmente - é verdade - pode ser substituída. Nem tanto em função da receita direta que proporciona. Basta ver que a receita tributária estimada para 2007 é de 658,7 bilhões de reais, enquanto o produto da CPMF está contido na escala de 36 bilhões. Mas sim porque o imposto sobre o cheque - aí sim - bloqueia uma série de hipóteses de sonegação. O controle da Fazenda sobre os rendimentos (do capital) passa a ser muito maior.

O controle sobre os salários já é total. Pois o desconto começa na fonte e termina na declaração anual de ajuste. Descontados na fonte, os assalariados não têm como escapar. Da mesma forma quando declaram anualmente. Pois se as empresas são obrigadas a efetuar os recolhimentos, o deles e de seus empregados, a fiscalização automaticamente torna-se absoluta.

Mesmo assim, no entanto, há empresas que fogem dos recolhimentos mensais. E não apenas os clubes esportivos. Se fossem apenas estes os sonegadores, a receita do INSS seria muito maior do que é. Basta lembrar, como publicou o Tribunal de Contas da União, com base em relatório primoroso do ministro Ubiratan Aguiar, que as dívidas de empresas para com a Previdência Social atingiram no final de 2006 o incrível montante de 144 bilhões de reais.

Cresceram 12 por cento em relação ao endividamento que possuíam em dezembro de 2005. No mesmo período de doze meses, enquanto o estoque da dívida subia 12 por cento, o resultado concreto das cobranças judiciais produzia um efeito de somente 0,5 por cento. Houve assim um aumento de 11,5 por cento na massa acumulada.

Como a inflação em 2006 foi de 3 por cento, verificou-se uma elevação real da ordem de 8,5 por cento. Muita coisa. Sobretudo porque tal processo parece não ter fim. Há alguns anos, o relator das contas previdenciárias foi o ministro Marcos Vilaça. Detectou um total de dívidas da ordem de 92 bilhões de reais, lembro bem. Num espaço de cinco anos, mais ou menos, os não pagamentos estocados na conta da Previdência subiram nada menos que 50 por cento. Por que o ministro Guido Mantega não se preocupa com tal fenômeno?

As dívidas de emresas para com o INSS são praticamente 4 vezes maiores do que a receita anual proporcionada pela CPMF. A Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira permite um controle maior no que se refere à incidência do Imposto de Renda sobre as operações de capital. Muito pouco quanto aos salários. Por que, então, esta conversa de conceder isenções mínimas aos assalariados para aprovar a prorrogação da CPMF? A Fazenda agiria melhor indo direto ao assunto. Uma questão de lógica e, sobretudo, de transparência.

Fonte: Tribuna da Imprensa Online

http://www.tribuna.inf.br/pedro.asp

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